Livros analisados por Allan Kardec
Variedades
O PERISPÍRITO DESCRITO EM 1805

Extraído da obra alemã: Os fenômenos místicos da vida humana, por Maximilien Perty, Professor da Universidade de Berna – Leipzig e Heidelberg, 1861.

Sob o título de “Aparição real de minha mulher após sua morte” – Chemnitiz, 1804 – o doutor Woetzel publicou um livro que causou grande sensação nos primeiros anos deste século. O autor foi atacado em vários escritos, principalmente por Wieland, que o leva ao ridículo na Euthanasia. Durante uma doença de sua mulher, Woetzel tinha pedido a esta última que lhe aparecesse após
sua morte; ela lho prometeu. Mais tarde, porém, a rogo do marido,ela se desligou da promessa. Todavia, algumas semanas depois de sua morte, um vento violento pareceu soprar no quarto, embora estivesse fechado; a luz quase se apagou; uma pequena janela na alcova abriu-se e, a despeito da fraca claridade que reinava, Woetzel viu a forma de sua mulher, a dizer-lhe em voz doce: “Charles, sou imortal; um dia nos reveremos.” A aparição e estas palavras consoladoras se repetiram mais tarde, uma segunda vez. A mulher mostrou-se de vestido branco, com o mesmo aspecto que tinha antes de morrer. Um cão que não se havia mexido quando da primeira aparição, agitou-se e descreveu um círculo, como se estivesse em redor de uma pessoa conhecida.

Numa segunda obra sobre o mesmo assunto (Leipzig,1805), o autor fala de convites que lhe teriam sido dirigidos para desmentir todo o assunto, “pois, do contrário, muitos sábios seriam forçados a renunciar ao que, até então, tinham julgado como opiniões verdadeiras e justas, e porque a superstição aí encontraria um alimento.” Mas ele já havia pedido ao conselho da Universidade de Leipzig que lhe permitisse prestar juramento a respeito. O autor desenvolve sua teoria. Segundo ele, “a alma, depois da morte, seria envolvida por um corpo etéreo, luminoso, por meio do qual poderia tornar-se visível; que poderia usar outras vestimentas, por cima desse envoltório luminoso; que a aparição não tinha agido sobre o seu sentido interior, mas unicamente sobre os sentidos exteriores.”

Como se vê, só falta a esta explicação a palavra perispírito. Contudo, Woetzel se equivoca quando julga que a aparição só atua sobre os sentidos exteriores, e não sobre o sentido interior. Sabe-se hoje que é o contrário que ocorre. Mas talvez ele
tivesse querido dizer que estava perfeitamente desperto, e não em estado de sonho, o que, provavelmente, lhe teria feito pensar que havia percebido a aparição apenas pela visão corporal, uma vez que não conhecia as propriedades do fluido perispiritual, nem o mecanismo da visão espiritual.

Aliás, lendo-se a erudita obra do Sr. Pezzani, sobre a Pluralidade das Existências, tem-se a prova de que o conhecimento do corpo espiritual remonta à mais alta antigüidade, e que só o nome de perispírito é moderno. São Paulo o descreveu em sua primeira epístola aos Coríntios, capítulo XV. Woetzel o reconheceu apenas pela força do raciocínio. Tendo-o estudado nos numerosos fatos que observou, o Espiritismo descreveu as suas propriedades e deduziu as leis de sua formação e de suas manifestações.

Quanto ao que se refere ao cão, nada há nisto de surpreendente. Diversos fatos parecem provar que certos animais sentem a presença dos Espíritos. Na Revista Espírita de junho de 1860, citamos um exemplo que tem notável analogia com o de Woetzel. Não está mesmo provado positivamente que não os possam ver. Nada haveria de impossível que, em certas circunstâncias, por exemplo, os cavalos que se assustam e se recusam, obstinadamente, a avançar sem motivo conhecido, sofram o efeito de uma influência oculta.

UM NOVO OVO DE SAUMUR

Ao que parece, Saumur é fecunda em maravilhas ovíparas. Lembram-se de que em setembro último, uma galinha, nativa dessa cidade e domiciliada na Rua da Visitação, punha ovos miraculosos, sobre cuja casca viam-se, em relevo e claramente desenhados, objetos de santidade e inscrições. Isto fez grande sensação em certos meios, e excitou a verve trocista dos incrédulos. O Echo saumurois, entre outros, divertiu-se bastante com a coisa. A multidão dirigiu-se ao local; a autoridade comoveu-se e sugeriram que um agente de polícia tomasse conta da galinha, para esperar o acontecimento. Não repetiremos o espirituoso relato, nem a menos judiciosa explicação, dadas pelo Sauveur des peuples, de Bordeaux, de 18 de setembro de 1864, ao qual remetemos nossos leitores para os detalhes circunstanciados do caso.

Ultimamente, um dos nossos assinantes de Saumur nos remeteu um outro ovo fenomenal, originário da mesma cidade, pedindo que examinássemos bem a fanfarrice que ele apresenta,conquanto não houvesse desenhos, nem inscrições. Não que ele acreditasse num prodígio, mas, ao contrário, para ter nossa opinião, a fim de a contrapor às pessoas muito crédulas em matéria de milagres, porque parece que, depois do que se havia passado, esse ovo também tinha produzido uma certa sensação no público. Não sabemos se é da mesma galinha. Eis do que se trata:

O ovo apresenta na ponta uma excrescência, em forma de cordão grosso, enrolado sobre si mesmo, da mesma natureza que a casca e aderente em toda a sua extensão, que é de 6 a 7 centímetros. Basta conhecer a formação dos ovos para se dar conta desse fenômeno. Sabe-se que o ovo é formado, inicialmente, de uma simples membrana, semelhante a uma bexiga, na qual se desenvolvem a clara e a gema, germe e alimento do futuro pinto. Por vezes alguns são postos neste estado. Antes da postura, essa película se cobre de uma camada de carbonato de cálcio, que forma a casca. No caso de que se trata, não sendo o conteúdo suficiente para encher a membrana vesicular, resultou que a parte vazia,
formando o gargalo da bexiga, ficou contraída, rebatendo-se e se enrodilhando sobre o próprio corpo do ovo. O depósito calcário, formado depois, endureceu-o todo, o que deu origem a essa excrescência anormal. Se toda a capacidade se tivesse enchido, o ovo teria sido monstruoso para um ovo de galinha, porque teria cerca de 10 centímetros em seu maior diâmetro, ao passo que tem uma dimensão ordinária.

Que relação pode ter tudo isto com o Espiritismo? Absolutamente nenhuma. Se dele falamos, é porque seus detratores quiseram associar seu nome no primeiro caso, não sabemos bem a que título, a não ser, conforme seu hábito, o de procurar todas as ocasiões de o ridicularizar, mesmo nas coisas que lhe são mais estranhas. Quisemos provar uma vez mais que os espíritas não são tão crédulos quanto dizem. Desde que um fenômeno insólito se apresente, eles procuram antes de tudo a explicação no mundo tangível, e não envolvem os Espíritos em tudo quanto é extraordinário, porque sabem em que limites e segundo que leis sua ação se exerce.
R.E. , janeiro de 1865, p. 41